A questão do aborto
Publicado no Região Sul
Há uns anos decidiram abortar a despenalização do aborto. Faltou coragem política para enfrentar um País cada vez menos católico e pio, embora crescentemente paternalista.
Para tomar uma decisão, aponto duas reflexões: quem beneficia e quem sai prejudicado. Claramente prejudicado, de facto e no limite, fica o feto. Não haja dúvida sobre isto. Por outro lado, os grandes beneficiados são milhares de mulheres que todos os anos recorrem ao aborto clandestino, colocando em risco até três anos da sua liberdade, a sua saúde ou mesmo a vida.
A despenalização da interrupção voluntária da gravidez permite erradicar desde logo um “mercado” clandestino, ilegal, que não paga impostos e que não é regulado, com a agravante de suprir uma necessidade envolta fragilidade emocional e risco de prisão, que inflaciona o preço deste acto. Ainda podemos discutir se é ético ou não, mas mais importante é perceber se o voto é esclarecido e informado. Ainda que seja sempre um voto e conte apenas como um!
Pessoalmente não sou a favor do aborto. O que não significa que seja contra. Votei favoravelmente no último referendo e votarei novamente pela despenalização. Pelos mesmos motivos: considero que a decisão deve caber ao casal, com acompanhamento psicológico e clínico, com regulação.
Em relação ao referendo, sou contra. O Governo tem meios mais baratos para perceber o que o País pensa ou quer. Foi eleito para isso. Não vejo vontade de referendar o TGV, ou outras “grandes” obras…
O nosso conceito de vida tem mudado com a evolução da ciência, dos costumes, com o processo de laicização da sociedade, da sua modernização, etc. Mas onde começamos a “ser”? Todos nós tivemos um início “anfíbio” até deixarmos o líquido amniótico, adquirindo subsequentemente o direito ao nome. Mas antes disso, quando? Com a fecundação? Quando começamos a responder a estímulos? Esta questão pode ser colocada em vários planos. Desde logo biológico, clínico e moral. Mas como no limite compete ao Estado, i.e. todos nós, a tarefa de decidir, legislar e submeter os restantes a essa decisão, ficamos novamente presos aos conceitos dualistas, pré-formatados, enviesados e redutores. Existirão sempre duas correntes. A decisão será sempre inconciliável. Já alterar o quadro jurídico que penaliza quem recorre ao aborto poderia ser uma saída, ainda que um pouco hipócrita. Alinhamos por agora com os Países sub-desenvolvidos. Por contraste, na maioria do hemisfério norte, o aborto é legal!
Mas apesar disto, o Estado deve actuar na área da prevenção, do planeamento familiar e da educação sexual, mas não deve competir a todos nós pagar a factura da IVG. Existe um sector privado capacitado. Até hoje têm pago do seu bolso. Devem continuar! O enfoque não deve ser no financiamento, mas na liberdade individual. Não sendo uma patologia em sentido estrito, não deve consumir recursos públicos, que são e serão escassos.
Venha o debate!
2006-11-09
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