2004-07-26

Vou colocar aqui um artigo de Outubro de 2003 (publicado no Magazine do Algarve) e outro em Agosto de 2003 (Região Sul):

Voando sobre um ninho de cucos

Na passada sexta-feira estourou mais um escândalo. Enfim, na realidade um escandalozinho, que será esquecido assim que deixar de ser novidade, ou com qualquer avanço no caso “Casa Pia”.

Alegadamente um helicóptero, contratado com dinheiro público para ajudar no combate aos incêndios, era utilizado para passeios “turísticos” por Lamego, com a conivência de membros dirigentes dos Bombeiros Voluntários, do piloto, entre outras pessoas, destacando-se o Coordenador Distrital da Protecção Civil.

Como vem sendo (infelizmente) comum, todas as classes profissionais têm as suas maças podres. Considero, no entanto, apropriadas as demissões, suspensões, afastamentos e outras medidas rápidas que permitam dignificar estas entidades. Mas gostaria de “pensar alto” convosco sobre este problema.

Ainda que não tenham cobrado os “passeios”, estes senhores estavam a utilizar bens adstritos a uma importantes missão, o combate aos incêndios. Abusaram por isso do poder que lhes estava confiado. Em Democracia, isto é inadmissível. Intolerável. Com a agravante de manchar a imagem dos Soldados da Paz, logo depois de um Verão especialmente duro.

É evidente a falta de preparação que muitos dirigentes têm para lidar com a responsabilidade. É também evidente a falta de coerência e fundamentalmente de moral.

Este assunto fez-me formular algumas questões que gostava de deixar por aqui:

Quanto custa por ano o aluguer da frota de helicópteros para apoio ao combate aos incêndios?
Qual é no orçamento da Defesa Nacional, o valor inscrito para manutenção e outros custos directos e indirectos dos helicópteros?
Quantos pilotos têm as Forças Armadas (FA)?
Quantos helicópteros têm as FA (ou aviões que permitam estas missões)?
Que tipos de missões fazem estes aparelhos no decorrer do Verão?
Qual o custo da sua adaptação para uso no combate aos incêndios?
Fará sentido o Estado financiar o aluguer de helicópteros civis e investir depois na manutenção dos aparelhos militares?

Sou apologista do esforço de redução do peso do Estado na Economia. Dos modelos que permitam colocar em gestão privada serviços públicos, mas também sou favorável à racionalização máxima dos recursos públicos (especialmente nos ramos das FA), justificando o esforço dos contribuintes. Este é um caminho óbvio.

É fundamental caminhar para a resolução destes problemas que vão aparecendo, rapidamente como foi este caso, passando a imagem que estes comportamentos serão exemplarmente punidos. Mas é também essencial incutir desde muito cedo nas camadas mais novas da população, que estes comportamentos são errados e imorais.

Para terminar, os responsáveis pelos “passeios aéreos Lamego” dizem que lhes foi montada uma “cabala”!
 Terem “organizado” os passeios e delapidado recursos públicos não terá ajudado, não???!!

 
 

Sobre os incêndios:Uma perspectiva realista

Venho reflectindo sobre este assunto desde há algum tempo. Já repararam que as florestas das empresa de celulose não são "atacadas" pelo fogo. Porquê? Porque têm um planeamento de emergência e apostam na prevenção.
A gravidade e proporções que este ano os incêndios têm assumido, com a morte de pessoas e a destruição de bens faz-me pensar que não tem sido feito um planeamento eficaz. Pensar que a culpa é do governo é uma falsa questão. A culpa é, muitas vezes, das pessoas. No caso das povoações e habitações dispersas, bastava que em volta destas fosse aberto um corredor de 30/40 metros para que o fogo, mesmo em condições extremas, seja detido, evitando-se muitas vidas perdidas e tantas casas destruídas.
Perdoem-me a minha análise, mas a frio, o mais importante é que este ano sirva de desculpa para reformular os planos de emergência municipais e nacionais, a própria legislação, em especial obrigando a criação dos corta fogos em zonas residenciais e a manutenção da floresta limpa. Também os produtores florestais e a população que vive deste recurso, ou habita nas suas imediações, podem pensar como evitar esta calamidade. Podem não, devem!
Umas das frases mais ouvidas pelas vítimas remete à desgraça e à perda de tudo. Faz-me lembrar a fábula da formiga e da cigarra; em vez de pedir ao estado, porque será que não partilham o risco, através de seguros, ou associam-se em mutuas. Pelo menos, procurem salvaguardar as habitações, prevendo um eventual incêndio. Mas o português está dependente do estado, a intervenção excessiva provocou a total dependência. É o problema da mão invisível, que está tão visível.
Relativamente à limpeza da floresta, considero que os presos poderia prestar um valioso serviço na prevenção de fogos, pagando assim as suas dívidas para com a sociedade, já que a privação da liberdade, na minha opinião, não é suficiente. O serviço comunitário deveria fazer parte da "terapia" de reinserção social e ocupação de tempo. Penso também que algumas penas menores poderiam ser convertidas na prestação deste serviço.
Quem recebe o Rendimento Mínimo Garantido, deveria também contribuir para a limpeza e vigilância das florestas.
Também quem aufere um subsídio de desemprego deveria ter que optar entre formação profissional ou serviço cívico, receber sem trabalhar desmoraliza e produz mais efeitos perversos do que estar ocupado. Sem prejuízo da procura de emprego, penso que nestes períodos críticos (i.e. o verão) a vigilância de florestas poderia ser uma valiosa contribuição.
Relativamente ao esforço que tem sido feito na requalificação das Forças Armadas, considero essencial que o Exército e a Força Aérea disponha de uma força conjunta de emergência para intervenção rápida em caso de incêndios de grandes proporções, reconvertendo e adaptando aviões para que estejam aptos para, além das suas missões "normais", combater o fogo; para além do esforço da coordenação operacional e gabinete de crise.
Um dos índices de sub-desenvolvimento está directamente relacionado com a forma de encarar as áreas florestais. Penso não ser um problema da direita ou da esquerda, mas das condições climatéricas, da incúria, do crime, demência e essencialmente da falta de respeito e fundamentalmente planeamento.
Já agora, penso que as penas para os criminosos que perpetram estes crimes deveriam ser agravadas, ao nível dos 20 anos de detenção, com uma pena efectiva mínima de 10 anos. Quem não quer, não queima...

 
 

Sem comentários: